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Em resumida análise, em sua segunda seção, o Projeto apontava cinco razões
pelas quais entendia pela possibilidade e necessidade de denúncia da Convenção n. 169
da OIT. Primeiro, interpretando o art. 39 do tratado
, o redator da proposta conclui que,
uma vez que a Convenção entrou em vigor mundialmente em 05 de setembro de 1991, o
próximo prazo para denúncia seria de 05 de setembro de 2021 a 05 de setembro de 2022
(Brasil, 2021).
O segundo argumento era o de que a legislação nacional é suficientemente
protetiva aos indígenas, não necessitando de complementos advindos de acordos
internacionais. Nesse plano, citando, equivocadamente, o entendimento do STF na
demarcação da terra indígena Raposa Serra do Sol, o PDL concluía que “o documento
jurídico internacional em tela não supera a Constituição, tornando-o supérfluo” (Brasil,
2021, online).
O terceiro argumento trazido pelo projeto era o de que “ao estabelecer a restrição
de acesso do Poder Público e de particulares em terras indígenas, bem como ao impor a
obrigação de prévia autorização para qualquer ação governamental nestas terras, o
tratado impediria o crescimento nacional”. Ademais, nesse sentido, afirmava também
que pela impossibilidade de se ingressar nestas terras e, assim, de se executar obras de
infraestrutura necessárias, citando, como exemplo, o fato de Roraima não participar do
Sistema Interligado Nacional de produção e transmissão de energia elétrica (Brasil,
2021).
Adiante, em sua quarta justificativa, o PDL n. 177/21 sustentava que o instituto
da autoidentificação, previsto no artigo 1, item 2
, da Convenção, como principal
requisito para a demarcação de territórios indígenas, era incoerente e que, embora “a
consciência da identidade indígena deva ser considerada como critério para
determinação desses grupos, não deve ser o critério único, pois isto dá oportunidade à
pessoas oportunistas que buscam esta Convenção para benefício próprio” (Brasil, 2021,
online).
Enfim, como argumento final, o projeto afirmava que o instrumento da consulta
prévia, livre e informada
dos povos indígenas que, como dispõe a Convenção, devia ser
realizada por instituições representativas, ao longo do tempo, foi deturpado e, hoje,
falava-se em consulta individual de cada membro destas populações, o que, segundo a
proposta, inviabiliza qualquer política pública sobre os direitos indígenas. Ademais,
arrematava dizendo que manter a previsão da consulta aos povos indígenas, do maneira
como tem sido interpretada, seria abrir mão da soberania nacional em terras indígenas, o
que contrariaria a Constituição Federal (Brasil, 2021, online).
Portanto, sem adentrar em eventuais equívocos interpretativos e factuais
contidos nas proposições do PDL 177/21 - os quais serão retomados no terceiro tópico -,
e, ressalte-se, nem concordando com qualquer das afirmações feitas no documento, a
análise do seu conteúdo visou tão somente expor as noções principais da proposta.
Logo, em momento oportuno, se avaliará se o projeto está em conformidade, ou não,
Dispõe que, a cada decênio, se abre o prazo de um ano para eventuais denúncias de Estados (OIT, 1989, online).
Art. 1.2: a consciência de sua identidade indígena “[...] deve ser considerada como critério fundamental para
determinar os grupos aos quais se aplicam as disposições da [...] convenção” (OIT, 1989, online).
Art. 6.1: “[...] os governos deverão: a) consultar os povos interessados, mediante procedimentos apropriados e,
particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou
administrativas suscetíveis de afetá-Ios [...]” (OIT, 1989, online).